sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O PRAZER COMO BEM SUPREMO EM EPICURO.









“O essencial para a nossa felicidade é a nossa condição íntima: e desta somos nós os amos”  Epicuro






“O Prazer como Bem Supremo em Epicuro”, é uma investigação acerca do prazer epicúreo, sua especificidade como via à imperturbabilidade da alma.


Essa gratificante aventura, ao passo que conduz ao cerne das idéias desse grande pensador eleva o espírito a um patamar de entendimento da natureza e do papel da filosofia para o ser humano como o meio genuíno, distinto, próprio do gênero, capaz de revelar a realidade. Nessa perspectiva a filosofia é para o Epicurismo a coisa mais cara e necessária a todos os seres humanos, por excelência um instrumento de libertação, via única à verdadeira felicidade.






“Que ninguém hesite em se dedicar à filosofia enquanto jovem, nem se canse de fazê-lo enquanto velho, porque ninguém é jamais demasiado jovem ou demasiado velho para alcançar a saúde do espírito. Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou, é como se dissesse que ainda não chegou ou que já passou a hora de ser feliz. Desse modo, a filosofia é útil tanto ao jovem quanto ao velho: para quem está envelhecendo sentir-se rejuvenescer através da grata recordação das coisas que já se foram, e para o jovem poder envelhecer sem sentir medo das coisas que estão por vir; é necessário, portanto, cuidar das coisas que trazem a felicidade, já que, estando esta presente, tudo temos, e, sem ela, tudo fazemos para alcançá-la”. (Epicuro, Carta a Meneceu, p. 22).






Questões como o autodomínio, a serenidade, o prazer, a ética, o entendimento da alma, a compreensão e convivência com a natureza, são assuntos abordados neste estudo.


Se preocupar com a realidade do todo é mister do filósofo. A realidade não está pronta, é preciso ir buscá-la com o entendimento. A possibilidade de se elevar o pensamento ao entendimento, é a grandiosidade do homem. É baseado na idéia de que o entendimento leva ao aprofundamento sobre a realidade que Epicuro vai deter-se nas questões que ele elegeu como fundamentais para o bem viver e para se chegar a ataraxia e a aponia, conseqüentemente à felicidade.


Epicuro foi o grande pensador que revolucionou a filosofia com o seu modo de vida simples em comunhão com a natureza, com seus princípios de prazer, felicidade e da imperturbabilidade da alma. Ele nos traz a possibilidade de escolha consciente entre o prazer e a dor, nos coloca a importância da amizade, do companheirismo, do entendimento da natureza como forma de conhecimento e clareza da própria vida. Uma filosofia despojada de preocupação com a retórica e com os malabarismos egóicos de se exibir em praça pública para grandes auditórios lotados. Para Epicuro a máxima “Viver obscuro”, afastado do burburinho da cidade, das discussões sofísticas e da política era importante como forma de conduta de vida para resguardar o virtuosismo do indivíduo em direção a felicidade verdadeira conquistada pelo prazer, oriundo do conhecimento. Ele foi antes de tudo um revolucionário. Daí instalar sua escola numa casa com jardim afastada da cidade. Ele e seus seguidores ficaram conhecidos como “os filósofos do Jardim”.


Em Epicuro existe a possibilidade do conhecimento e não da dogmatização do conhecimento. O conhecimento do homem se dá na relação com a natureza. Não há em Epicuro teologia nem metafísica no sentido escolástico, há metafísica no sentido ontológico.


A conquista da paz de espírito é um desejo comum ao homem e segundo ele todos podem consegui-la, se quiserem. Para esse fim, Ele abre as portas do jardim para homens, mulheres (incluindo as prostitutas), crianças e escravos, todos em igualdade e comungando dos mesmos ideais.


Ele fala sobre a canônica, a física, e a ética, esta última como o meio para alcançar a felicidade, o prazer e a imperturbabilidade da alma. Ele chamava os sentidos de mensageiro do verdadeiro. A sensação é a via que nos mostra a realidade, não podendo nunca uma sensação falhar.


Segundo ele, há dois tipos de afecções: o prazer e a dor.




”Prazeres e dores são os sinais da natureza para avançar e parar em todos os níveis da existência”. (Brun, O Epicurismo, 70, p. 54).




O ponto fundamental para a ética de Epicuro é referente a esses dois tipos de afecções, o prazer e a dor, a partir daí ele vai desenvolver a sua ética. Além das afecções, existem também as efecções que são as impressões que os sentidos fazem em nós, podendo ser agradáveis ou não.


O prazer é o cerne, a mola mestra em que se arrola a filosofia de Epicuro. O prazer referido não é o prazer frívolo, carnal, irresponsável, pelo contrário, é o maior bem da alma, causa prima de toda motivação humana. Por isso na elaboração da sua ética ele avisa sobre as conseqüências dos prazeres e sobre os prazeres imediatos e os duradouros, estes que o indivíduo deve conquistar durante a sua vida. Com a vida consciente e serena pode-se controlar e tornar os prazeres um bem permanente. O autocontrole, a temperança a serenidade e o sentimento da amizade são motivadores do prazer. Para tanto deve o indivíduo se afastar de todos os apegos sejam eles bons ou ruins. A filosofia é o “remédio” que anula os medos dos homens.


“O epicurismo pedirá ao homem para viver de acordo com a natureza confiando nas mensagens da sensação dada ao mesmo tempo como critério do verdadeiro – por isso, é o epicurismo um sensualismo – e como critério do bem – por isso, é o epicurismo um hedonismo”. ( Brun, O Epicurismo, edições 70, p. 22).


O hedonismo em Epicuro leva ao domínio de si mesmo. Esse domínio tem como base a escolha consciente da vida junto à natureza e completamente afastado das ilusões e paixões desenfreadas, que levam ao sofrimento.


Para Epicuro o prazer é o princípio e o fim da vida feliz. Esse prazer leva a ataraxia (imperturbabilidade da alma), a aponia (ausência de dor física), a autarquia (domínio de si) e ao prazer do ventre que está ligado tanto ao estômago, com uma nutrição saudável e natural, como está ligado aos órgãos sexuais, ao prazer sexual.


A moderação do apetite é relevante para a satisfação plena sem a necessidade do esbanjamento artificial e o prazer sexual longe dos olhos da moral cerceadora, que julga, critica, condena e causa sofrimentos, promove uma satisfação, um enorme bem-estar físico e psíquico e a felicidade. Nessa questão o equilíbrio é fundamental no sentido da auto-preservação, se não, ocorre um processo inverso de degeneração e sofrimento.




“Nenhum prazer é em si um mal, mas algumas coisas capazes de engendrar prazeres trazem consigo mais malefícios que prazeres”. ( Brun, O Epicurismo, edições 70, p. 103).




O prazer tem o sentido de se harmonizar com o Todo; que anula as carências e promove a plenitude.


Para o epicurismo rememorar momentos prazerosos assume uma importância relevante. Essa capacidade que o homem tem de reter fatos felizes do passado e sentir-se feliz novamente ao rememorá-los lhe confere poder de escolha entre a dor e o prazer e está sempre presente.


O equilíbrio é fundamental para a filosofia epicúrea, visto que é ele que conduz a satisfação interior e a felicidade. Esse equilíbrio está diretamente ligado a virtude, no sentido da prudência, beleza e da justiça.


A ética de Epicuro é a via de acesso para a libertação da alma humana da ignorância ou de infundadas crenças que o aterrorizam, tornando-se assim, uma via de acesso à verdadeira felicidade.


Na sua filosofia ele estabelece uma hierarquia dos desejos: os desejos naturais e necessários; os naturais e não necessários; e os nem naturais e nem necessários. Os primeiros são as necessidades básicas de sobrevivência, como comer, beber e dormir. Nessa questão ele fala do sábio contentar-se com o que a natureza lhe põe ao alcance. A natureza é pródiga e farta em saciar os desejos naturais e necessários.


Depois vêm, os desejos naturais e não necessários que são aqueles relacionados também as necessidades primárias, mas que o homem pode enriquecer, variar e refinar.


O terceiro, são os artificiais por excelência, nem naturais nem necessários. Estes são concebidos pelos homens. Deles pode sobrevir sofrimentos. Os desejos de fama, poder, riqueza, a cobiça e uma interminável lista de atributos criados pela ganância do homem, causadores dos desequilíbrios e da degeneração.




“Os insensatos nunca estão satisfeitos com o que têm, mas afligem-se com o que não têm. Os insensatos ficam inchados de orgulho na prosperidade, mas abatidos na adversidade, aquele que não sabe contentar-se com o que tem será infeliz, mesmo que se torne o mestre do mundo”.( Brun, O Epicurismo, edições 70, p. 108).




Com relação aos desejos nem naturais nem necessários, o sábio simplesmente evita-os, mas não conseguindo evitá-los, é fundamental a prudência na escolha desses prazeres. Para o homem que procura o equilíbrio interior e a felicidade, é necessário desviar-se dos prazeres vãos e fúteis para gozar da tranqüilidade e da imperturbabilidade da alma.


Com sua filosofia naturalista ele fala de dois temores que impedem o homem de encontrar a felicidade: o medo da morte e o medo dos deuses.


Epicuro nos ensinou ainda sobre o Tetraphármacom:


*deus não é de se recear;


*a morte não é nada para nós;


* o bem é fácil de se obter;


*o sofrimento é fácil de suportar.


Viver para conhecer a realidade, não se preocupar com as coisas fúteis da vida, compreender a natureza é fundamental. Conseguir entender e incorporar essas quatro formas de bem viver de Epicuro é o caminho para a Ataraxia e a Aponia.


A finalidade da ética de Epicuro é o objetivo da sua filosofia, ou seja, a questão do bem e do prazer para a realização de uma vida serena e feliz. Ele fala do prazer em repouso, ou seja, do prazer estável, que atinge um ponto de equilíbrio e mantém-se livre de carências.






“O limite da magnitude dos prazeres é o afastamento de toda dor. E onde há prazer, enquanto existe, não há dor de corpo ou de espírito, ou de ambos”. (Epicuro, Os Pensadores, 1980, p. 14).






Para ele as perturbações e alegrias são estados psíquicos. Além de vivenciar as dores e prazeres corpóreos, as manifestações da psique, do ponto de vista do equilíbrio interior e do domínio de si, são influenciados pelos estados conscientes e inconscientes. É interessante essa consideração porque envolve também o poder da racionalidade e da lógica para entender as escolhas que nos levam a ataraxia e a aponia, para desfrutar da felicidade ou do sofrimento pelo livre arbítrio.


O equilíbrio está relacionado diretamente à felicidade, a não-carência, a plenitude da vivência ataráxica. A alma, para Ele, é um corpo dentro do corpo, um corpo sutil que compõe um corpo físico denso, que serve como ligação, a união corpo denso-corpo sutil (corpo-alma). A alma é composta por duas partes: o Logikon, que é parte racional da alma, e o Alogon, que é a parte irracional. É a alma que imprime sentimentos, sensações e movimento ao corpo. A alma anima o corpo, dá vida às sensações, aos sentimentos e a mobilidade. Há uma interação plena entre corpo e alma. Um desequilíbrio gerado no corpo repercute na alma e vice-versa. Sendo assim existem as doenças físicas e as psíquicas que se somatizam no corpo.


Epicuro só vai pensar a ética depois de pensar a física, ele vai buscar a resposta da complexidade do ser humano na natureza.


Ser feliz é o grande objetivo de Epicuro, o amadurecimento não diz respeito a idade, a filosofia provoca o amadurecimento do espírito. A felicidade pode ser traduzida por Eudaimonía, ser tomado por um bom estado de espírito, ou por Makarios zen, a vida bem aventurada. Só a filosofia proporciona esse estado de felicidade.


No Jardim de Epicuro existia uma verdadeira prática terapêutica para o corpo e a alma, através do Tetraphármacom e das recordações dos momentos de prazer anteriormente vivenciados. Aprofundavam no entendimento da psyché, a psicologia da alma e sob a luz desse conhecimento buscava-se entendimento sobre os temores das doenças, das angústias, dos sentimentos e sensações que levam a alma ao desequilíbrio.


Para Epicuro o verdadeiro prazer e a verdadeira felicidade consistem em um equilíbrio sereno da alma, somente possível quando se silencia as paixões: a cobiça, o medo, e a dor, todos esses "ciclones da alma". Se esse apaziguamento é bem sucedido, desaparece toda agitação de nossa alma. Quando se consegue isso, surge a autêntica atitude filosófica: a "imperturbabilidade" do espírito, a "calmaria" da alma, a "bonança".


Na proporção em que a filosofia deixa o campo das paixões e se cristaliza no patamar da razão torna-se um factível “Remédio da alma”, acessível a quem por meio dela fizer uso dessa faculdade. É no exercício da razão que se dá o prazer profícuo, verdadeiro e esse se constitui um bem supremo. A razão proporciona o prazer e o verdadeiro prazer tem o sentido da racionalidade.


Para Epicuro a filosofia é prática de vida, a mais auspiciosa e necessária atividade humana, via de acesso a ataraxia, e a aponia; ao bem supremo.


Ciente e praticante dessa filosofia livre das atribulações do mundo, distante das circunstâncias dos ditames sociais, superado tudo o que for ameaça a paz da alma, o filosofo tem a auto-suficiência conquistada pela liberdade do espírito.


O sábio epicurista não é eremita, mas, deve viver afastado da vida pública principalmente da política que exauri a quietude racional da alma. Livrar-se das concepções geradas pelas necessidades circunstanciais do convívio social é fundamental para o modo de vida epicurista. Essas concepções são um campo de embate onde obscuras forças se debatem sem jamais chegar a um entendimento. São forças que estão baseadas na mitologia ou na ignorância. Para o indivíduo que pretende se consagrar ao entendimento seria um escoadouro de suas energias e faculdades. Portanto a filosofia epicúrea é naturalista. Quem busca entendimento deve preparar-se para beber na fonte original da natureza, no conhecimento do cosmos e não nas representações consagradas pelos antigos poetas.


Pelo que vimos Epicuro se revela um ícone inquestionável da modernidade. Sua filosofia é o germe da nossa contemporaneidade. A direção que ela deu ao entendimento; os fundamentos e a sua prática são o prenúncio de um tempo novo que somente se desvendaria centenas de anos mais tarde no ocidente.






“É vã toda Filosofia que não cure algum mal do espírito humano.”Epicuro


JANAINA ISMENIA DE MELO.
(foto de Epicuro tirada da internet)

2 comentários:

  1. Olá Janaina.
    Todos gostaríamos que, depois de tantos avanços nas áreas da ciência e de tecnologia, de tanta evolução em todos os segmentos, descobertas, curas, aprimoramentos, etc...,que a humanidade entrasse num período de descanso, de objetivar apenas desfrutar estas conquistas. Contudo o que vemos é o homem cada vez mais inquieto, mais agitado, mais fatigado, sobrecarregando até a alma de cansaço. Então é inevitável a pergunta: Em um mundo como o nosso, é possível a ataraxia?
    Como diz um adição que fizeram de uma frase do Eclesiastes: "Correr atrás do vento cansa e entope suas veias de vazio"

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  2. Mulher chata pq vc simplesmente ñ diz o que é ataraxia e aponia

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